quarta-feira, 26 de agosto de 2015

A Mitologia Egípcia

Embora existam inúmeras divindades na mitologia egípcia, um número cada vez maior de estudiosos dos antigos mitos está entrando em acordo ao dizer que a religião dos antigos egípcios era, na verdade, uma espécie de monoteísmo. A crença difundida de que as antigas histórias e as imagens representadas nos templos representavam diferentes entidades supremas (deuses e deusas) nada mais é do que uma confusão causada pela tradução da palavra "neter" que os antigos usavam para se referir às forças cósmicas. Cada um  dos "deuses" venerados nas escrituras e na vida cotidiana egípcias eram originalmente chamados de neteru (plural de neter). No nosso conceito ocidental falta uma palavra  que se encaixe melhor nesse conceito de "neter" então usamos a palavra "deus", embora ela cause certo incomodo por se confundir com o conceito ocidental de Deus.

Cada neter, ou deus egípcio, representa uma função, uma característica, um princípio específico da Força Suprema à qual os egípcios não deram nenhum nome. Esta Força, essa Inteligência, esse Princípio Cósmico que a tudo criou e a tudo permeia é o que realmente se aproxima do conceito de Deus ao qual estamos familiarizados no ocidente. (A palavra neter também é, segundo alguns filólogos a origem da palavra "natureza").

É importante salientar aqui que, embora os egípcios representassem os neteru utilizando formas antropomórficas e de animais, filosofia egípcia não se baseava na crença de que tais criaturas realmente existissem na forma como eram representadas. Essas ilustrações não passam de símbolos escolhidos com cuidado para falar sobre os fundamentos dos princípios específicos aos quais se referem. Por exemplo: , por representar a origem Consciência Suprema, era mostrado carregando o sol na cabeça, pois, se a Luz é o símbolo da consciência, então não há melhor símbolo para a origem da consciência suprema do que o Sol, a maior fonte de luz que temos. A cabeça de falcão era usada pois esta criatura possui outro elemento do que os egípcios chamariam de "natureza solar": uma criatura que voa a grandes alturas, que enxerga longe, que "tudo vê", etc. Hórus também era representado com cabeça de falcão, mas sem o Disco Solar, pois ele evocava a imagem do senhor dos céus, mas não do sol. O falcão, quando visto voando majestosamente nos céus, senhor de seus domínios, evoca a ideia de que o céu é seu território natural.

O corpo humano nas imagens dos neteru indicava que aquele princípio estava sendo representado como era visto do ponto de vista pessoal, subjetivo e imperfeito inerente à condição humana.

Outro exemplo: quando se fala das Águas Primordiais, do Oceano do Caos que existia no Princípio, não se está falando de um oceano físico que existiu certo dia num determinado lugar. As propriedades de um oceano físico e real são meramente o reflexo das características essenciais do Oceano Ideal no sentido platônico, ou seja, infinito, indivisível, desconhecido e inescrutável. Essa eram as ideias que verdadeiramente estavam sendo expressadas com o uso dos símbolos.

Existem diferentes versões para cada passagem das histórias mitológicas do Egito encontradas em diversas fontes como o Texto das Pirâmides, o Livro dos Mortos, as inscrições nos templos e tumbas,  etc. As versões também variavam com o tempo, afinal de contas, são histórias que foram contadas repetidamente por mais de 5 mil anos.

As diferentes formas como eram contadas as histórias, apesar de serem, por vezes, conflitantes, eram também complementares, e, utilizando-se de um esforço para estabelecer uma ordem cronológica para os eventos, podem ser reunidas na forma de uma síntese que englobe todos os diferentes aspectos das diferentes cosmologias a começar na Origem: Os mitos de criação.

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Os Mitos de Criação do Egito Antigo

Diferentes Cosmogonias

Um dos mitos mais importantes, senão o mais importante, de toda a mitologia egípcia é aquele referente à criação do Universo. Porém, grande parte dos mitos egípcios conta com duas ou mais versões e há vários detalhes que se tornam confusos devido à variedade de formas de se contar a mesma história. Quando se fala de cosmogonia egípcia, há quatro versões principais que eram correntes em quatro importantes cidades  do antigo Egito: HermópolisHeliópolis, Tebas e Mênfis.

Essas versões, apesar de diversas, são, na verdade, focadas em diferentes aspectos do mesmo evento e podem ser vistas, algumas vezes como conflitantes, mas também são complementares. Isso se deve ao fato de que tanto os mitos quanto os deuses neles descritos, são intercambiáveis. Às vezes um grupo de deus descrito num certo mito difundido numa determinada época e lugar pode ser substituído por uma outra entidade única que represente todos eles de uma vez só quando esse mito é contado em outra versão numa outra época e outro lugar. para que essa característica da "intercambialidade" não torne o entendimento da mitologia total um tanto confusa à, deve se pensar nos diferentes mitos como diferentes maneiras de se contar uma mesma história ou diferentes formas de se explicar a mesma coisa e que, dependendo da época e do lugar, as pessoas preferiam uma forma ou outra.

Heliópolis

A maior fonte pela qual é conhecida a chamada "Cosmogonia de Heliópolis" são os Textos  das Pirâmides que são considerados os escritos religiosos mais antigos já encontrados. São escrituras cravadas nas pedras das pirâmides de Saqqara por volta de 2400 AC.

Um pedaço dos chamados Textos das Pirâmides.

Representação do benben
 exposta no museu do Cairo.
De acordo cosmogonia Heliopolitana, no início havia apenas o caos indiferenciável conhecido como Nun (abismo). Nun é descrito como um oceano inerte, infinito e escuro.

O primeiro evento ocorrido neste oceano foi o surgimento de um monte em forma de pirâmide chamado benben, também conhecido como Ovo Cósmico. Quando o Sol, representado pela figura de , nasceu pela primeira vez e tocou o benben a entidade conhecida como Atum passou a existir. Atum-Rá "criou a si mesmo", "tonou-se a si mesmo".

Logo que surgiu, Atum, a partir de si mesmo, criou seus quatro descendentes, Shu, Tefnut, Geb e Nut. Este momento ficou conhecido como Zep Tepi, A Primeira Ocasião, ou o Primeiro Evento.

De Geb e Nut nasceram quatro filhos Osíris, Ísis, Set e Néftis.

O grupo formado por oito deuses era chamado de a Enéade de Heliópolis. Eles eram Atum-Rá, Shu, Tefnut, Geb, Nut, Osíris, Ísis, Set e Néftis.  



Atum e Rá são uma entidade dupla que segue o princípio místico numérico de que o Um deve se tornar Dois. Eles são um só ser, mas possuem dois nomes pois devem ser entendidos como dois aspectos opostos desse ser: sujeito e objeto, isto é, aquele que conhece e aquele é conhecido.

Atum

é o Sol. Ele  surgiu pela primeira vez mundo quando saiu do monte benben e subiu para espalhar a Luz no mundo. Neste contexto, a Luz deve ser entendida como a Quintessência da existência, ou seja, Consciência. era representado como um ser com cabeça de falcão carregando o Disco Solar rodeado pela serpente Ouroborus como coroa, sendo que o Ouroboros, neste caso, representa exatamente a natureza cíclica ou fechada do ser que conhece a si mesmo e o sol, sendo a fonte definitiva da Luz/Consciência.

Se é o sujeito, Atum é o objeto (Atum surgiu quando a luz de tocou o benben, ou seja, quando se se tornou consciente dele). Às vezes se usa o nome de Atum, às vezes se usa o nome de , dependendo do contexto do acontecimento narrado.

Atum-Rá é a forma pessoal do universo em oposição à forma impessoal e inconsciente que era Nun. Ele representa o início da consciência e da existência. Ele é transformação do Um em Dois.

"Atum é o Ba de Nun."

Hermópolis

Nun é aqui representado como um ser feito
de água que possui tanto atributos masculinos
quanto femininos (repare que ele tem um ceio).
Ele segura o símbolo da Folha de Palmeira
que significa vida eterna e faz alusão a sua
vasta idade.
Alguns traços da cosmogonia de Hermópolis são encontradas nas mesmas fontes daquelas da de Heliópolis. Esta cosmogonia dava especial atenção ao que aconteceu antes da criação, na natureza do Oceano Primordial de Nun.  Seu panteão de criadores era um grupo de oito entidades chamados de a Ogdóade.

Os oito princípios da Ogdóade firmavam quatro casais. Os seres masculinos são representados com cabeças de sapo e as femininas com cabeça de serpente. Cada casal representa um diferente aspecto daquele estado primordial do ser:
  • Huh e Hauhet representam as extensões infinitas de Nun;
  • Kuk e , Kauket, personificam a escuridão completa e a inconsciência daquele estado do ser;
  • Amon e Amonet, representam a natureza oculta e inescrutável de Nun em contraste com o mundo tangível dos vivos;  
  • Por último havia o próprio Nun e Naunet que representavam o oceano em si..
Mas o principal deus cultuado na cidade era Thot.

Thot
Thot era chamado e o "vizir de ". O oceano de Nun era a alma de Toth e ele, usando seus dons da sabedoria ele criou as palavras e deu voz à vontade de que foi o que permitiu ao Universo tomar existência. Rá era o criador, mas ele só podia criar atravez de Thot que era quem "traduzia" sua vontade em "palavras" propiciando uma existência objetiva.

Segundo algumas fontes, Thoth é um ser que gerou a si mesmo, como Atum-Rá, segundo outras ele era filho de . Ele foi aquele que, posteriormente, criou as artes, a matemática, as linguagens humana, arquitetura, engenharia e as ciências além de exercer papel preponderante das mediações de conflitos entre o deuses e seres humanos. Ele era também associado À lua e à marcação do tempo sendo representado como um homem com cabeça de Íbis (uma ave nativa do Egito) ou, mais raramente, como um babuíno. Sua contraparte feminina era Seshat e sua esposa era Maat.

O monte benben, segundo a cosmogonia de Hermópolis, surgiu quando as oito divindades da Ogdóade. Ou, em outra versão no oceano de Nun boiava uma solitária flor de lótus. Os membros masculinos da Ogdóade ejacularam nela e ela se fechou. Quando se abriu novamente de dentro dela nasceu na forma de uma criança criadora de tudo.
Os oito membros da Ogdóade com cabeças de rã e serpente seguidos da imagem de Atum-Rá nascido da flor de lótus simbolizando o nascimento a partir do caos.(Os hieróglifos e as imagens egípcias devem ser lidos da direita para a esquerda.)



   

Mênfis 

A chamada Teologia de Mênfis chegou até nós através de uma inscrição na Pedra de Shabaka que é uma laje de granito com escritos hieróglifos.
Ptah portando seus símbolos.


Esta cosmogonia idolatra a figura criadora de Ptah. Ele era o patrono dos artistas e artesãos e teria criado o universo com suas habilidades artísticas. Era chamado de pai dos deuses da pré-criação (Ogdóade), ou seja, ele era o criador de Nun. Aos mesmo tempo ele foi aquele que quebrou o ovo primordial do benben e de lá surgiu para criar o mundo como o conhecemos. O processo do zep tepi seria a "metamorfose de Ptah" de um ser inexistente para um ser existente que criou a si mesmo.

Ele, então, com uma palavra, criou a Enéade (Atum, Shu, Tefnut, Geb, Nut, Osíris, Ísis, Set e Néftis). A palavra falada foi o que deu origem a tudo. O que surgia em seu coração ele criava através da língua.

Sua esposa era Sekhmet e seu filho era Nefertem.

Essa cosmogonia engloba as outras duas. Sua diferença é que ela acrescenta "um grau" na hierarquia dos acontecimentos, isto, é tudo que aconteceu foi comandado por Ptah. Ele é Num, Atum e Rá.

Em suas representações, Ptah é mostrado como um homem de pele verde envolto num tecido branco, como se estivesse mumificado, mas , na verdade ele está aprisionado.. Em suas mãos ele segura três símbolos combinados em um só: o bastão Was, o Ankh e o pilar Djed (estabilidade, vida e poder). Ele fica em pé sobre um objeto na forma do hieróglifo que significa Maat que é a ordem, ou a Lei universal em oposição ao Caos primordial. Assim como os ferreiros, que são seus representantes na terra, Ptah moldou o universo utilizando os quatro elementos para criar tudo que existe.

Tebas

A cosmogonia mais tardia entre as quatro citas é a de Tebas onde Amon, uma entidade presente na Ogdóade original, toma o lugar de Atum-Rá como entidade criadora.

Amon, Amen,
ou Amun
Seu nome faz referência ao desconhecido e ao impenetrável. Era dito que ele transcendia todos os outros deuses e que "existia além dos céus" e era "mais profundo que o submundo". Sua verdadeira natureza era mistério até mesmo para os outros deuses. Era representado como um homem usando um barrete (capuz sarcedotal) grandes plumas na cabeça.
Mut é a contraparte feminina de Amon. Seu símbolo é uma mulher com a coroa dupla e um abutre na cabeça. O nome"mut" significa "mãe". Essa palavra foi a percursora do inglês "mother", do   alemão "mutter", etc.

Na época da XVIII, a cidade de Tebas assumiu grande importância político-religiosa e por isso os sacerdotes daquela cidade, usando do poder que haviam adquirido, elevaram o deus patrono da cidade ao status de criador de todas as coisas e o nome de Amon (os Amen), começou a ser adicionado ao nome do faraó. Com o tempo, o poder religioso do culto a Amon acabou adquirindo mais poder do que o próprio faraó na sociedade egípcia e, pela primeira vez, começaram a ser desenvolvidos conceitos dogmáticos e monoteístas. Antes os todos os deuses eram considerados como representantes de propriedades e características de única entidade inominável. Agora essa entidade tinha nome: Amon, o deus de um milhão de faces.

domingo, 23 de agosto de 2015

Shu e Tefnut, Geb e Nut

Shu e Tefnut nasceram da vontade de Atum num de auto procriação, já que, apesar de ser uma entidade masculina, ele ainda possuía dentro de si a sua contraparte feminina original: Naunet.

Tefnut
Shu
As versões de como Atum criou seus dois filhos variam bastante. É dito que com um espirro ele criou Shu e depois botou Tefnut como se fosse um ovo. Essa versão faz trocadilhos com os nomes dos deuses. Outra versão diz que Atum se masturbou, sendo que a mão usada no ato representaria a parte de sua natureza feminina. Existem imagens mostrando Atum com o próprio pênis na boca formando uma variante do Ouroboros representando o ato de auto-procriação. Há ainda outros textos que dizem que ele casou-se com sua sombra, a deusa Iusaaset e que ela era a avó de todos os deuses. Também é dito que Atum-Rá retirou seu próprio coração e o atirou no ar onde ele se dividiu e formou seus filhos.

Shu é associado ao ar e aos ventos que era comumente representado usando uma coroa de penas de avestruz. Tefnut, sua irmã/esposa era associada à umidade e à chuva e era mostrada como uma mulher com cabeça de leoa.

Diz a lenda que, certa vez, Shu e Tefnut saíram para se aventurarem no espaço vazio e se perderam. Rá, preocupado, mandou seu olho para procurá-los. Quando eles retornaram, ficou tão feliz que chorou. De suas lágrimas nasceram os primeiros seres humanos.

Shu e Tefnut tiveram dois filhos: Geb e Nut.

Geb
Nut
Geb e Nut são os filhos de Shu e Tefnut.

Geb é associado à terra (matéria) e é representado às vezes como um homem com cabeça de serpente (criatura rastejante que possui propriedades terrenas), ou como um homem carregando um pássaro na cabeça, ou ainda como um homem deitado no chão sob Nut.

Nut é associada ao céu (espírito) em oposição à terra. Ela é representada, às vezes, como uma mulher com um hieróglifo sobre a cabeça que significa jarro de água.  ou como uma mulher enorme estendida sobre Geb.

Quando os dois se casaram, Atum temeu que seus futuros filhos pudessem querer tomar seu trono e proibiu que Nut tivesse filhos em qualquer dia do ano. Ela então ela foi procurar a ajuda de Toth.


Khonsu
Para ajudar Nut, Toth resolveu desafiar seu amigo Khonsu para um jogo de Senet.  

Khonsu era filho de Amon e Mut. Ele é representado tendo cabeça de falcão como Rá, mas, ao invés de usar o sol acima da cabeça, ele usava a Lua, astro com o qual ele é relacionado. Outras vezes era mostrado como um homem mumificado portando a lua na cabeça. É o deus do tempo. (A pronuncia de seu nome Khons ou Cons, mais tarde seria importada pelos gregos que o transformariam em Cronos, deus grego do Tempo.)

Toth apostou com ele: a cada partida que ele ganhasse, Khonsu deveria lhe dar um pouco de sua luz. Quando terminaram o jogo, Toth havia ganhado luz suficiente para fazer cinco dias e, como esses dias não faziam parte do ano, Nut pode usá-los para ter seus filhos: OsírisÍsis, Set e Néftis.

Nut (acima) e Geb (deitado no chão) separados por Shu.
Quando Atum soube disso ele ficou tão furioso que obrigou Shu a separá-los.

Então, o céu (Nut) foi separado da terra (Geb) pelo ar (Shu). Tefnut, sendo a esposa de Shu, é às vezes retratada ajudando seu marido a separa os dois. Ela é a umidade que permeia o ar entre o céu e a terra e se manifesta na forma de chuva. Em épocas de seca, dizia-se que Tefnut havia ido embora, ou que havia brigado com Shu.

A separação do céu da terra, naturalmente, não deve ser visto de forma literal. Neste contexto o céu é o espírito e a terra é a matéria. Nos poucos momentos em que espírito e matéria se uniram nasceram quatro dos principais deuses existentes, mas, a partir desse momento, todos os seres seriam obrigados a viver num universo onde espírito e matéria estão separados para pagar o "pecado original" que Shu e Tefnut cometeram ao contrariar as ordens de Atum.

Posteriormente os cinco dias que Toth havia ganhado foram adicionado aos 360 dias do ano que passou a ter 365 dias.



quarta-feira, 19 de agosto de 2015

A História de Osíris, Set e Hórus

 Os filhos de Geb e Nut foram Osíris, ÍsisSet e Néftis.

Osíris

Osíris
Osíris se casou com sua irmã Ísis Set se casou com sua irmã Néftis. 
Osíris está associado com a vida após a morte e a ressurreição. Ele é comumente representado como um homem mumificado em cima do símbolo de Maat usando o Atef que combinava a coroa branca do alto Egito com duas penas de avestruz. Em suas mãos estavam o mangual e o cajado reais, símbolos da autoridade do faraó. A cor verde de sua pele simbolizava a ressurreição dos mortos e fazia alusão ao verde que surgia depois das épocas de seca e depois das cheias do Nilo que era quando as terras "voltavam à vida após o período de morte". Embora a versão mais difundida seja a que ele era filho de Geb e Nut, uma versão mais obscura sugere que ele era filho de Rá.

Osíris é um dos deuses mais importantes da antiga religião egípcia. Seu nome significa "muitos olhos"

Set

Set
Set é o deus que representa o ar seco do deserto e os períodos de seca eram a ele atribuídas. Ele era também associado à violência, às tempestades do deserto e aos estrangeiros. Era representado como um animal desconhecido que os egiptólogos chamam de "animal de Set" que pode ser alguma animal que existiu antigamente e agora está extinto ou a mistura de vários animais ou, ainda, um animal mítico. Outras vezes ele é personificado pela figura do hipopótamo, criatura selvagem e violenta.
Set em sua forma totalmente animal

Apesar de ser o inimigo de Osíris e personificar, até certo ponto, o mal e a desordem, Set não era uma entidade totalmente maligna e não personificava as forças do caos, como alguns intérpretes das mitologia alegam.Segundo o mito, todas as noites, quando (o sol) descia ao submundo, Set lutava contra a serpente Apófis que personificava as verdadeiras forças do caos para impedir que ela destruísse a Ordem das coisas.

Ísis e Néftis


Ísis
Néftis
Existem muitas semelhanças entre Ísis e Néftis e, ao contrário de seus irmãos, sua relação sempre foi harmoniosa.
As duas eram chamadas de "Grande Mãe" e os atributos e funções de ambas eram muito parecidos. Certas versões da história fazem confusão com os pares e colocam Néftis como esposa de Osíris e Ísis como esposa de Set. 

Ísis era representada como uma mulher usando a figura de um trono no alto da cabeça, símbolo da rainha. Várias vezes ela aparece com asas nos braços e  também com chifres que carregam o disco solar vermelho no meio.

Néftis era mostrada como uma mulher usando na cabeça a figura de uma casa com um cesto em cima, algo parecido com uma jarra, símbolo da feminilidade. Outras vezes ela aparece com asas nos braços iguais aos de sua irmã.
Aqui os símbolos de Ísis e Néftis e são invertidos. Ísis está à esquerda (como ela era rainha, o trono encimava sua cabeça). Néftis está à direita com a figura em forma de jarra na cabeça, mas aqui ela possui as asas que são mais comumente atribuídas a Ísis. No meio das duas está Osíris antes de ser mumificado.

O Complô de Set

Como Osíris era o primogênito de Geb, ele e Ísis tornaram-se o rei e rainha da Kemet (nome original das terras do Egito) quando Geb abdicou ao trono.

Naquela época os seres humanos levavam uma vida primitiva na pré-história. Sob o reinado de Osíris a humanidade aprendeu os fundamentos da civilização. Ele levou aos povos do neolítico o conhecimento das bases da agricultura, domesticação de animais, o culto à natureza do universo (neteru/deuses) e lhes deu leis. Toth agraciou a humanidade com suas criações: matemática, escrita, arquitetura, artes, ciências engenharia, etc. Logo o povo de Kemet atingiu altos graus de sofisticação e prosperidade.

Porém, Set, que governava os desertos alimentava uma grande mágoa contra seu irmão, Osíris. Os motivos de seu ressentimento eram vários. De acordo com os Textos das Pirâmides, além de almejar o trono, Set também queria se vingar por Osíris ter mantido relações sexuais com sua esposa/irmã Néftis, o que resultou no nascimento de Anúbis (dependendo da versão ela seduziu ou foi seduzida por Osíris ). Set também queria revanche por um chute que teria levado de seu irmão.

Com a ajuda de setenta e dois conspiradores, bolou um plano para eliminá-lo.

Set convidou Osíris para um banquete. No decurso da festa ele apresentou um sarcófago e disse aos convidados que era um presente que ele daria àquele que nele coubesse. Um a um, os comparsas de Set foram entrando no sarcófago e, como nenhum deles cabia, Osíris decidiu experimentar. Mas o que ele não sabia era que o objeto havia sido feito com sua medidas e, assim que ele entrou, Set e seus conspiradores fecharam e trancaram Osíris. Então eles jogaram o sarcófago no rio Nilo sua correnteza o arrastou até as águas do Mar Mediterrâneo.

A Busca de Ísis

Desesperada com o ocorrido, Ísis sai em busca do marido/irmão. Ela segue o rio até a desembocadura no mar e chega à cidade de Kypt (Biblos) onde descobre que os galhos de uma árvore (tamareira) haviam crescido ao redor do sarcófago envolvendo-o completamente. Está árvore havia sido cortada e usada para fazer uma coluna do palácio real local. Para poder retirar o sarcófago que agora estava incrustado profundamente na coluna do palácio, Isis precisou tornar-se ama da rainha que, segundo algumas versões, não era ninguém menos que Astarte, a divindade mítica da Babilônia (lá ela era conhecida por "Baalate", forma feminina para Baal).
Astarte, ou Ishtar da Babilônia, rainha de Biblos.
Em algumas versões, a rainha ajuda Isis a retirar a coluna do palácio e, então, ela volta ao Egito com o sarcófago de seu marido. Porém, em outra versão, Astarte não estava tão disposta a ajudar a rainha egípcia e precisava ser persuadida.

Tentando convencê-la a devolver-lhe o sarcófago de seu marido, Isis, que era uma grande mestre nas artes mágicas, tenta conceder imortalidade ao filho mais novo dela expondo-o ao fogo, mas acaba matando-o. Durante o caos que se seguiu à morte do príncipe, Ísis retirou a coluna do palácio onde estava Osíris, sequestrou o filho mais velho de Astarte e fugiu de volta para o Egito.

Chegando lá, o rapaz a surpreendeu ao beijar o rosto de Osíris. O olhar que ela dirigiu a ele foi tão cheio de fúria que ele morreu naquele instante.

Set ficou sabendo que Isis havia recuperado o sarcófago de seu irmão. Ele o encontrou e o esquartejou picotando seu corpo em diversos pedaços (a quantidade de pedaços difere de acordo com as diferentes versões da história) e espalhou-o pelo deserto, com exceção de seu pênis que foi jogado no Nilo.

A Ressurreição de Osíris

Osíris sentado no trono. Atrás dele estão Ísis e Néftis.
Na flor à sua frente estão os quatro filhos de Hórus
que representam aspectos do ritual de embalsamento.





Mesmo após o esquartejamento de seu marido, Isis não desistiu. Transformou-se numa ave e, com a ajuda de sua irmã, Néftis, encontrou um por um os pedaços espalhados, juntou tudo e Anúbis, criador das técnicas de embalsamento, envolveu Osíris em bandagens fazendo dele a primeira múmia da história Ísis, mestre que era nas artes mágicas de vida e morte, preencheu-o com o Sopro da Vida, o Pneuma e o trouxe de volta dos mortos.

No entanto, Osíris não estava completo. Faltava o pênis que havia sido comido por um peixe. Então ela fabricou um pênis que, de acordo com as diferentes versões da história, foi feito com diferentes materiais: galhos de árvore, ouro ou simplesmente  magia. Ela pousou sobre o ombro de Osíris, Thot retirou o sêmen dele e usou para inseminar o ventre de Ísis. E assim nasceu Hórus.

A partir de então, Osíris foi viver no submundo tornando-se o rei daquela região e deus dos mortos.

Hórus

Hórus é uma das divindades mais importantes do panteão egípcio, apesar de ser filho de Osíris, várias interpretações da mitologia e filosofia egípcias o veem como reencarnação do mesmo. Nas escrituras, o faraó em vida era relacionado a Hórus, e, depois da morte era realacionado a Osíris.

 Uma estela de 1400 a.C., contém um hino sobre o nascimento de Hórus:
Hórus com a coroa dupla do
Alto e Baixo Egito
Oh benevolente Ísis
que protegeu o seu irmão Osíris,
que procurou por ele incansavelmente,
que atravessou o país enlutada,
e nunca descansou antes de tê-lo encontrado.
Ela, que lhe proporcionou sombra com suas calças
e lhe deu ar com suas penas,
que se alegrou e levou o seu irmão para casa.
Ela, que reviveu o que, para o desesperançado, estava morto,
que recebeu a sua semente e concebeu um herdeiro (Hórus),
e que o alimentou na solidão,
enquanto ninguém sabia quem era...
Néftis amamentando o
pequeno Hórus.
Ísis, após ter dado à luz Hórus, escondeu-o nas terras pantanosas do delta do Nilo, longe dos olhos de Set. Onde Néftis o criou amamentou. Ela é retratada em várias pinturas na forma de uma vaca que amamenta o pequeno Hórus. Os Textos das Pirâmides se referem a Isis como aquela que deu à luz e a Néftis como a mãe que o criou. (aqui novamente as figuras de Ísis e Néftis se misturam: as duas eram mãe de Hórus.)

Sua mãe sempre lhe dizia que ele deveria crescer para proteger o povo contra seu tio Set e que deveria vingar morte de seu pai.

Como Set representava a secura do deserto, muitos interpretam as brigas entre ele, Osíris e Hórus como sendo a ameaça de épocas secas que sempre chegavam no Egito.

Na maioria das vezes, ao nascer, um deus masculino tinha sua contraparte feminina que era seu oposto harmonioso. Como isso não aconteceu com Hórus, ele foi encontrar sua contraparte em Set, mas, como os dois eram masculinos, sua relação não foi de harmonia.


Uma das muitas trindades da mitologia. O pai (Osíris), o filho (Hórus) e a mãe (Ísis).

A Contenda de Hórus e Set 

(História completa aqui.)

Hórus cresceu num Egito governado por Set, e, quando atingiu a idade adulta, foi perante os deuses da Enéade afirmar que era verdadeiro herdeiro do trono e que Set devia ser deposto.

Depois de muita discussão na corte dos deuses, Set decidiu desafiar o sobrinho. O prêmio para o vencedor seria se tornar o novo Rei. Nesta época, Hórus começou a ser reverenciado no Baixo Egito (norte do Egito) enquanto que Set era cultuado no Alto Egito (sul do Egito).

Vários tipos de disputas aconteceram naquela época.

Briga de Hipopótamos

Os deuses da Enéade propuseram o seguinte desafio: Set e Hórus se transformariam em hipopótamos e, aquele que sobrevivesse mais tempo debaixo d'água seria o vencedor.


Depois de vários meses passados do início do desafio, nenhum dos dois dava indícios de que sairia da água tão cedo, então Ísis resolveu interferir novamente. Ela atirou um arpão na água mas acertou Hórus por engano. Na segunda tentativa, porém, ela acertou Set e o fisgou. Ela o havia subjugado e podia matá-lo, mas Set implorou para que ela o deixasse viver e Ísis acabou cedendo.

O famoso símbolo do
Olho esquerdo de Hórus
Quando descobriu que sua mãe havia, novamente, libertado seu inimigo, Hórus ficou furioso e decepou sua cabeça demonstrando aos outros deuses o quanto ele podia ser perverso. Set o perseguiu e, ao encontrá-lo dormindo, retirou seus dois olhos.

A deusa Hator encontrou Hórus solitário e chorando sem os olhos na montanha. Ela capturou uma gazela e retirou seu leite e o usou para restaurar os olhos de Hórus.

 

Disputa Homossexual

Os deuses da Enéade decretaram que uma trégua deveria ser feita e Set convidou Hórus para dornir em sua casa.
Para afirmar sua dominação sobre Hórus, Set seduziu-o e teve relações sexuais com ele. Sua intenção era ejacular seu esperma dentro do corpo de Hórus, mas Hórus o enganou e o fez ejacular em sua mão, capturou o sêmen dele e jogou no rio para que ninguém pudesse dizer que Set o havia fecundado. Então, Hórus ejaculou secretamente seu próprio sêmen num pé de alface, que era o alimento preferido de Set. Depois que Set havia comido o alface, os dois foram novamente perante os deuses da Enéade para uma nova audiência sobre a regência do Egito. Set disse que podia provar sua superioridade sobre Hórus e chamou pelo seu sêmen. Todos esperaram a resposta, mas quando ela chegou, perceberam que ela vinha do rio, invalidando sua afirmação. Então foi a vez de Hórus, e, quando ele chamou seu sêmen, ele respondeu de dentro de Set fazendo o conselho decidir a seu favor.

Corrida de Barcos

Após oitenta anos de lutas e violência incessantes, os deuses da Enéade decidiram que o impasse seria decidido numa corrida de barcos. E, para tornar as coisas mais interessantes Set sugeriu que os dois deveriam usar barcos feitos de pedra.

Set cortou o topo de uma montanha para fazer seu barco, mas Hórus decidiu trapacear e construiu um barco de madeira e o cobriu com uma pasta de calcário para que parecesse pedra.

Os deuses se reuniam às margens do Nilo para assistir à corrida. Set chegou ao local da largada e atirou seu barco que ele afundou instantaneamente fazendo com que os deuses explodissem em gargalhadas.

Envergonhado e furioso, Set se transformou novamente num hipopótamo e atacou Hórus em seu barco. Os dois lutaram intensamente, mas Hórus logo tomou vantagem. Esteve prestes a matar seu inimigo, mas os outros deuses o impediram e decidiram encerrar a disputa decretando o empate entre os combatentes.

Muitos dos deuses simpatizavam com Hórus, mas sentiam certo receio pelo modo como ele havia se enfurecido com o ato de bondade de Ísis e estavam incertos sobre apoiá-lo completamente. Eles decidiram escrever uma carta a Osíris no submundo para pedir conselhos. Hórus ofereceu-lhe, como tributo, seu olho mágico. Osíris respondeu sem sombras de dúvidas que seu filho, Hórus, era o verdadeiro Rei. Ninguém, segundo ele, deveria tomar o trono do Egito através do assassinato. Set havia matado Osíris, mas Hórus não matara ninguém e era a melhor escolha.

Assim, ficou decidido, depois de muita luta, que Hórus era realmente o rei de Kemet, e Set finalmente aceitou abrir mão do reinado, não por que havia perdido as batalhas, mas por que a Lei dos deuses havia falado.

Amarrando as duas Terras


Os gêmeos Hapi amarrando as terras
Os faraós do Egito eram comumente referidos como sendo "Senhor das Duas Terras" e existem várias imagens mostrando o faraó e sua cópia num ato simbólico de "amarrar" as duas terras que, segundo alguns,

Segundo alguns, as duas terras são o Alto e o Baixo Egito (sul e norte respectivamente). Mas há quem interprete essa "amarração" de outra forma. Para alguns isso representa a união de dois lados opostos, o fim do conflito entre diferentes aspectos da vida e o início da harmonia.

Hórus e Set no ato simbólico de
 "amarrar as duas terras".
A representação mais comum do ato de amarrar as duas terras era a imagem dos deuses gêmeos Hapi que, apesar de terem um só nome, eram duas entidades que representavam a fertilidade que as águas do Nilo propiciavam naquelas terras em oposição à aridez das terras distantes do rio. Eles eram representados como homens azuis (referência às águas). Seus cabelos eram verdes e deles nasciam plantas e flores. Os dois possuíam uma barriga protuberante (simbolizando a plenitude fértil das colheitas por vir) e possuíam um único seio.

Há uma imagem que mostra Hórus e Set realizando o ritual de amarrar as duas terras, o que simboliza o fim de sua guerra e o início de uma convivência pacífica entre esses dois elementos conflitantes. Este elemento do mito reforça o fato de que Set não representava as forças do caos, pois ele aceitou a derrota assim que ela foi proferida pelos seus semelhantes, tamanho era seu respeito pela Lei.